terça-feira, 27 de abril de 2010

O Romantismo e as Ciências Sociais 11: Pobreza e Experiência


Man Ray, the gift (1921)

Jonatas Ferreira

Antes de ler Infância e História, nunca havia percebido suficientemente certas nuances do artigo “Experiência e Pobreza” (1933) de Walter Benjamin. Em minhas leituras desse texto, que versa sobre o sentido da vida nas sociedades modernas, sempre prevaleceu a percepção de um humor soturno ao qual eu opunha a visão mais solar de “Obra de Arte na Época de sua Reprodutibilidade Técnica” (1936/1955). “Experiência e Pobreza” lembra muito o pessimismo com o qual Weber nos brinda em “Ciência como Vocação” (1919). Todos nos lembramos da passagem em que ele recorre a Tolstoi para concluir que a vida para o homem moderno não tem significado. Na verdade, não tenho grandes simpatias com relação ao projeto sociológico weberiano, porém essa coisa menos controlada, essa palestra proferida sob a emoção e impacto do pós-guerra, e renegada pouco tempo depois, comove pelo desespero do diagnóstico. Max Weber chuta o pau da barraca: para o homem moderno vida e morte não têm significado, ele afirma. “E não o tem porque a vida individual do homem civilizado, colocada dentro de um “progresso” infinito, segundo seu próprio sentido imanente, jamais deveria chegar ao fim; pois há sempre um passo à frente do lugar em que estamos, na marcha do progresso”. (p. 166). A palestra prossegue afirmando que, por tudo isso, na sociedade industrial, moderna, podemos cansar-nos da vida mas jamais nos saciar dela. Bem, é verdade que para chegar à radicalidade dessa conclusão, que se assemelha em muito ao que Benjamin dirá no “Experiência e Pobreza”, repito, ele nos faz entrar num calvário de considerações sobre a vida acadêmica alemã do começo do século XX. Era um chato incurável. Quem já se deu ao trabalho de ler seus ensaios metodológicos haverá de concordar comigo.


5 comentários:

Tâmara disse...

Jonatas,
Chato é você. Brincadeirinha, você é um doce de criatura, mas não sei porque essa implicação com Weber! Eu aprecio muito seus textos metodolo'gicos. Ele sempre me comove com sua obsessão em se sustentar entre deux: a preocupação com o rigor de uma demonstração cienti'fica e a preocupação com a subjetividade como nu'cleo das ciências sociais. Os desesperos incontidos de seus diagno'sticos (lembro agora do final de A E'tica Protestante), são literariamente deliciosos. Outras coisas dele, é verdade, incomodam-me bastante. Poli'tica como Vocação, por exemplo, quando penso que foi palestra conferida para soldados da Alemanha derrotada...Passemos.
Mas queria entender melhor algo de seu texto: quando você afirma que a conclusão do existencialismo de Sartre pode ser semelhante ao que nos ensina Sade, o que você quer dizer? Abraço.

Le Cazzo disse...

Oi, Tâmara.

E olhe que Weber nunca me ofendeu - nem mesmo o povo da família dele, como é o caso da professora Silke. Mas os dilemas metodológicos neokantianos são muito aborrecidos, mesmo. Você é uma alma tolerante.

Quanto a Sartre e Sade. É que Sartre acreditava que toda relação amorosa resultaria na objetificação do outro/da outra. Isso é o que me lembro das coisas de Sartre que li há muito tempo.

E obrigado pelos comentários. Jonatas

Tâmara disse...

Jonatas,
Embora o contexto europeu 2010 seja daqueles que revelam a urgência da tolerância nos assuntos humanos, confesso que meu caso com Weber não é de tolerância, mas de afinidades eletivas e relativas. Eu também devo ser uma chata neo-kantiana, mas sempre acho que quase todos os tipos de chatos têm seu charme.
Quanto a Sartre, entendi. E' que como você vinha falando do niilismo ocidental e de como o texto de Benjamin, embora aparentemente soturno, tenha notas sobre a possibilidade da técnica propiciar um novo tipo de exeriência, fiquei pensando que o existencialismo sartriano, se refletido à moda de Agamben sobre Benjamin, é também animado por notas sobre as possibilidades da experiência. Mas estou talvez dizendo besteiras: ha' quanto tempo nem penso em Sartre...Abraço.

Gustavo Fontes disse...

Jonatas, chefia,

parabéns pelo texto. árduo exercício de exegese com belos questionamentos teorórico-metodológicos. Percebo voccê constantemente ao redor desta angústia benjaminiana-heideggeriana.
Admiro, claro, e muito, os aportes metodológicos de Weber, mas me sinto mais próximo da linha de Bergson, quando postula a "duração real" para tratar do "lebenswelt" (mundo da vida).
E é neste ponto mesmo, pra mim crucial, que acho se teu texto tímido, ou avaro quanto ao que póderíamos acrescentar a estes teóricos canônicos, com o que temos de peculiar, como pessoas que gostam de dançar e jogar bola. Penso que esse nosso corpo tropical erotizado (e por isso também, brutalmente influenciado pelo consumo de massa) talvez tenha algo de realmente novo a acrescentar, além da crise por que passa o solipsismo ontológico. crise esta que permeia todo o seu texto!

sem mais, abraço. e até breve.

Le Cazzo disse...

Tâmara,
Você está longe de ser chata e suas afinidades eletivas e metodológicas com Max Weber devem ser parte do tal charme de que você fala. Quanto a Sartre, o problema é que para Agamben provavelmente o existencialismo capitaneado pelo moço seria parte do problema e não da solução - ele ainda estaria preso a uma metafísica do sujeito, a Descartes. Etc. etc.

Gustavo,
Salve. No texto em questão, Agamben também passa por Bergson e Dilthey. Achei que não acrescentariam tanto diante do que já tenho dito sobre a importância da crítica de base romântica ao Sujeito do conhecimento como fundamento do moderno. A referência à pscianálise também daria conta da crise dessa noção de subjetividade. Daí a omissão. Quanto ao "nosso corpo tropical erotizado", bem, no que me diz respeito, eu vou ao culto todo sábado e domingo, sou temente a Deus, e lá na congregação não tem disso não. Mas é claro que poderemos falar de uma erotização do corpo que nada mais seria que seu consumo nos moldes já definidos aqui: esvaziamento, perda de significado, o consumo em larga escala que esconde a impossibilidade da "experiência" no terreno amoroso. Bem, mas aí você poderia dizer que os cultos duas vezes por semana estão enrijecendo minha cintura. E não estaria errado. Jonatas