sábado, 8 de outubro de 2011

Um Pardal voando sobre um Ninho de Cucos


Por Artur Perrusi

Toc, toc, toc, ô de casa, tem alguém aí?!

Eita que desapareci, hein?! Bem, as justificações cansam a verdade. Reapareci, eis a questão. Talvez, um mistério filosófico seja o fato de as pessoas aparecerem e desaparecerem. São até irritantes nesse movimento.

Publico uma resenha do filme "Um Estranho no Ninho". Achei-a no meu baú de textos perdidos. Seria publicada, prometeram-me. Prometer é um ato falho. Não publicaram, e me esqueci do dito-cujo. Dei uma recauchutada e publico aqui e agora.

Um Pardal voando sobre um Ninho de Cucos[1]

Não farei, aqui, uma análise desse clássico do cinema, “Um Estranho no Ninho”, e sim aproximações entre as temáticas do filme e a psiquiatria ou, melhor dizendo, entre o filme e minha experiência como psiquiatra e sociólogo. Será, digamos assim, uma exposição que apresentará algum cunho pessoal. Claro, esforçar-me-ei para que a narrativa não fique idiossincrática, tentando contextualizá-la e, com isso, conectando-a a uma totalidade mais ampla. O jogo entre filme e experiência pessoal, nesse sentido, permitirá um exame mais geral do poder institucional da psiquiatria.

O filme é uma adaptação do livro de mesmo nome do escritor estadunidense Ken Kesey. Foi escrito em 1962, num contexto histórico bem significativo, marcado pela contracultura. O autor, pode-se dizer, condensa bem a época: um polemista e crítico ferino da sociedade americana, tendo sido um ícone da juventude beatnik e hippie. Foi um dos gurus do LSD. Sua crítica à instituição psiquiátrica tem como pano de fundo a condenação do “american way of life”. E a conclusão é ambiciosa: a psiquiatria prefigura o modelo das instituições modernas. Ela é totalitária e, ao mesmo tempo, norma das outras instituições. O controle comportamental imposto pela psiquiatria, nas suas instituições, é a base das relações de dominação existentes na sociedade. Em suma, vive-se, na América, uma espécie de totalitarismo “doce”, sem um específico centro de poder, embora sistêmico, baseado num enquadramento normativo do comportamento que transforma os indivíduos em meros vetores do sistema.

O filme foi realizado em 1975. Vivia-se, ainda, a rebordosa dos anos 60. Os temas da década passada continuavam vivos, embora com menos otimismo e psicodelismo. A antipsiquiatria continuava sendo a crítica hegemônica, diante do sempiterno domínio do asilo psiquiátrico. Contudo, não creio que o filme tenha o alcance da crítica de Ken Kesey, conquanto permaneça a contundência contra a instituição psiquiátrica. Pode-se, é claro, interpretar a relação conflituosa entre Randle McMurphy (Jack Nicholson) e Mildred Ratched (Louise Fletcher) como metáfora dos conflitos existentes na sociedade americana, mas não iria por esse caminho. De todo modo, é justamente essa relação, interpretada de forma genial pelos dois atores, que é o fulcro do filme. E creio que ela seja muito útil para pensar o alcance da crítica à psiquiatria.

Inclusive, depois do “Estranho...”, surgiram outros filmes com temáticas direta ou indiretamente relacionadas à psiquiatria. Com o tempo, a crítica antipsiquiátrica arrefeceu, e os filmes passaram a não contestar, propriamente, a validade da psiquiatria, e sim alguns modelos de assistência, principalmente aquele baseado no asilo. Geralmente, na nova safra de filmes, o psiquiatra tem salvação, sim, contanto que esteja fora do padrão asilar, e assuma uma prática profissional que seja relacional, dialógica e de profundo respeito pelo paciente, agora transformado em usuário da assistência psiquiátrica. Lembrando-me rapidamente de alguns filmes, tais como “As loucuras do Rei George”, “Gênio Indomável” e “Garota, Interrompida”, nota-se que o psiquiatra deixou de ser a besta-fera, podendo ter ideias modernas, uma postura informal e, quem diria, demonstrar até mesmo... emoção.

Mas, vamos ao filme.

Randle McMurphy é um detento que é enviado a uma clínica psiquiátrica. Por quê? Há dúvidas sobre sua sanidade. Ele é doido ou não? Sua estadia na clínica é, justamente, para a comprovação diagnóstica de sua suposta loucura. Ora, o espectador descobre, rapidamente, que McMurphy finge ser louco – inclusive, o diretor da clínica desconfia bastante de seu comportamento. Por meio desse artifício, cria-se uma conexão imediata entre o espectador e o personagem. Diria que, praticamente, é inevitável, a partir dessa situação singular, ter uma empatia por McMurphy.

A primeira questão, assim, que coloco em discussão, seria a seguinte: é possível simular a loucura? Não é uma questão simples e tem consequências clínicas e, até mesmo, filosóficas. Embora a questão não seja simples, a resposta é rápida: sim, é possível simular um surto psicótico, um sofrimento psíquico, uma doença mental. O problema aparece quando se examina as possíveis consequências dessa resposta. Uma delas seria a seguinte: o fato de existir a possibilidade de simulação implica que a loucura não seja uma doença mental? Não é uma pergunta banal, pois a psiquiatria não tem, para a maioria de suas doenças, exames complementares, isto é, objetivos, digamos assim, que mostrem, de uma vez por todas, a “realidade” da loucura. Não há raio-x, ultrassonografia, exame laboratorial que comprovem que a pessoa está “louca”. Uma doença orgânica é uma unidade discreta que pode ser examinada de forma objetiva. Sem a demonstração objetiva, a loucura seria completamente subjetiva, logo, passível de ser simulada? Sendo subjetiva ou uma forma de subjetividade, seria doença? Afinal, no que se baseia o psiquiatra para firmar seu diagnóstico? Ora, basicamente, no comportamento. Mas, caso seja isso mesmo, como apreender objetivamente sintomas psicopatológicos por meio da observação do comportamento de uma pessoa? Ora, o exame do comportamento implica fazer atribuições psicológicas a uma pessoa. Como projetar atributos psicológicos a uma doença? A “doença”, como tal, não sente, não sofre, não significa, exceto metaforicamente. Tais atribuições não podem ser discretas, como uma doença orgânica, por isso a atribuição sempre remete, invariavelmente, a uma totalidade, no caso, à pessoa doente.

Na medicina, a etiologia revela o invisível, mostrando que o visível é apenas epifenômeno. O comportamento patológico é a manifestação de causas ocultas, reveladas pela ciência médica. Mas a psiquiatria, justamente por não ter um consenso etiológico (afinal, qual é a causa da loucura?), é uma medicina de sintomas. Jamais escapou do comportamento. Nunca se libertou de uma compulsão classificatória -- vide seus manuais de “Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais” (DSM) e suas classificações nosológicas. Como deduzir, dessa forma, patologias do comportamento? Como evitar confusões no campo do significado, isto é, entre o normal e o anormal, entre o anormal e o patológico? Como evitar a transformação da psiquiatria numa máquina de etiquetagem, num empreendimento moral?

Sinceramente, não sei.

Por que isso acontece? Tenho algumas hipóteses. Resumo algumas:


  1. “a "doença mental" (DM) é um fenômeno sui generis na medicina. Ela jamais conseguiu ser enquadrada pelo paradigma biomédico da medicina. Sendo o objeto profissional da psiquiatria, sua instabilidade, como representação médica de doença, condiciona diversas dificuldades no campo do saber psiquiátrico: falta de consenso etiológico, confronto de diversos paradigmas de doença, desvalorização do conhecimento psiquiátrico. A psiquiatria, por causa da sua incapacidade de enquadrar cientificamente a DM, possui uma fragilidade disciplinar no campo da formação profissional da medicina. Tais problemas estabelecem diversas tensões na identidade profissional dos profissionais que atuam no campo da saúde mental;
  2. a psiquiatria é uma das poucas disciplinas médicas, senão a única, que nunca teve um consenso etiológico e nosológico[3] estável, isto é, uma representação única e estável guiando a conduta dos psiquiatras, sempre sofrendo assim uma inadequação permanente com a representação biomédica de doença. Num certo sentido, ela sempre foi "fraca" no aparato de formação médica e na luta pelo seu reconhecimento disciplinar dentro da própria medicina, conseguindo tardiamente e de forma mitigada diferenciar-se da neurologia, e "forte" no campo institucional, com seus aparelhos de tratamento especiais, separados do campo da saúde em geral. Não conseguindo, do ponto de vista disciplinar, assegurar um consenso, o saber psiquiátrico fica mais "frágil" diante das interpelações de outras esferas de saber produtoras de representações sobre a “doença mental”, embora compense essa situação com seu forte aparato institucional. Por isso, a dificuldade em enquadrar de forma normativa a “doença mental”, como um objeto profissional da psiquiatria e da saúde mental como um todo. Não causa surpresa que tal enquadramento tenha sido interpretado, por diversos autores[4], muito mais como uma questão de poder do que de saber. Assim, a transformação da “doença mental” num objeto profissional da psiquiatria envolve, também, um conflito político com outras representações de “doença mental”, disseminadas de forma difusa em vários segmentos sociais, seja incorporando-as, seja eliminando-as ou diminuindo seu alcance cognitivo (Perrusi, 2007). É um embate importante, pois envolve a preponderância de quem pode classificar uma categoria social tão vital, como a “doença mental”. Dessa forma, é a disputa por um mandato social que permite a um grupo social determinar, de forma exclusiva, categorizações sobre um fenômeno social. Ao transformar a “doença mental” em objeto profissional, logo, numa representação profissional, a “doença mental” torna-se um objeto específico, pois marcada pelo grupo profissional. E seria através dessa especificidade, enquanto objetos profissionais, que são valorizados socialmente;
  3. assim, como objeto profissional, a “doença mental” é de difícil conformação e, inclusive, seria fonte de representações exatamente por ser polimorfa e de difícil apreensão. Como tal, está numa situação diferente da doença dita somática, cuja normalização é mais profunda e antiga, sendo um objeto profissional de muito mais fácil apreensão e controle. Devido ao seu caráter um tanto inapreensível, a necessidade de controle do seu objeto profissional, para os psiquiatras, tornou-se uma questão de identidade e de coesão social. Sua apropriação, enquanto objeto, constitui um desafio que coloca em xeque a legitimidade profissional da psiquiatria. Ao contrário dos objetos profissionais da profissão médica, a “doença mental” não possui um consenso etiológico, permitindo assim a concorrência de diversas representações psiquiátricas do objeto profissional, criando uma profusão de nosologias e práticas terapêuticas. Sem consenso, os psiquiatras e os profissionais da saúde mental não estariam, como os neurologistas, por exemplo, submetidos a uma instância de regulação que definiria um sistema ortodoxo (conjunto de regras e práticas relacionadas, no caso da medicina, ao diagnóstico e, principalmente, ao tratamento) de controle do objeto profissional. Além do mais, mesmo que possamos admitir que exista, de fato, um sistema ortodoxo na psiquiatria, ele não seria consensual, estando sujeito a revisões constantes e sendo fonte de eternos conflitos entre os psiquiatras e os profissionais da saúde mental;
  4. com um sistema ortodoxo de fraco enquadramento normativo, a delimitação de fronteiras entre saberes e representações é fundamental na construção do campo da saúde mental. A questão é importante, pois a psiquiatria lutou sempre pela transformação da "loucura" em "doença mental", portanto, pela ratificação da “doença mental” como seu objeto de conhecimento e profissional. A luta foi e é também por um monopólio discursivo — a logorréia da psiquiatria sobre o seu objeto corresponde ao silêncio das outras produções discursivas sobre o fenômeno mais geral da loucura” (Perrusi, 2010).
Pois bem, acredito que o filme explore de uma maneira genial a profunda contradição do empreendimento psiquiátrico. Temos um personagem, vindo de outra instituição total (Goffman, 1974), a prisão, que finge ser louco, tentando enganar dois establishments da ordem: o sistema carcerário e a psiquiatria – inclusive, temos outro suposto fingidor, o “Chefe Bromden” (Will Sampson), um índio, em plena crise etnológica (mais adiante, falarei desse personagem singular); temos os verdadeiros pacientes psiquiátricos, que assumem seus papéis de doentes, flutuando nas fronteiras porosas que separam o normal do patológico; e temos, enfim, a personificação do Mal ou da Psiquiatria ou do Sistema, como queiram, a enfermeira-chefe Mildred Ratched (Louise Fletcher).

Aqui, vale uma observação. Não deixa de ser sintomático que seja a enfermagem e não a medicina que personifique o sistema. Cadê os guardiões do hospício, isto é, os médicos?! Aparecem de forma discreta. É Mildred Ratched que incorpora as contradições do poder psiquiátrico. Os médicos só surgem quando a loucura transborda e se torna incontrolável. Expõem-se diretamente somente na hora do choque elétrico e da lobotomia; em suma, são um recurso de última instância, seja na terapia, seja na punição. Na pax psiquiátrica, a enfermagem serve como mediação entre os pacientes e os psiquiatras; no contato com o louco, funciona como amortecedor; na engrenagem de moer almas e de fabricar loucura, que é o asilo, representa o que, na fábrica, era o capataz.

No fundo, pensava assim quando assisti, pela primeira vez, ao filme. Revê-lo, fez-me, confesso, contemporizar um pouco com a enfermeira-chefe. Percebê-la mais humana, mais contraditória. Se antes personificava a banalidade do Mal, fiquei mais atento, agora, às suas ambiguidades e aos seus limites. Depois de tanto tempo, olhar uma Mildred Ratched com face humana não deixa de ser paradoxal. Mas digo isso em relação ao filme, pois Mildred, no livro, é a “Chefona” e não tem, convenhamos, uma face propriamente angelical, justamente o contrário, pois sempre
“está sonhando um mundo de precisão, eficiência e limpeza, como um relógio de bolso com o fundo de vidro, um mundo no qual a programação é intocável e todos os pacientes que não estão do Lado de Fora, obedientes sob o seu comando, são Crônicos em cadeiras de rodas com sondas que descem direto de cada perna para o esgoto sob o assoalho” (Kesey, 2007: 47).
Se a enfermeira-chefe personifica o poder psiquiátrico, ela encarna sua ambiguidade suprema: a instituição psiquiátrica é uma atividade que se alicerça na repressão e na terapia. O filme, nesse sentido, não é ambíguo, pois baseia toda sua catarse no aspecto repressivo da atuação de Mildred Ratched, induzindo ou, simplesmente, fazendo com que o expectador esqueça seu papel terapêutico. Mesmo nas sessões de psicoterapia de grupo, a enfermeira-chefe aparece como repressora e indutora de comportamentos adequados à repressão institucional do hospital psiquiátrico. A terapia é vista como uma espécie de “lavagem cerebral”, isto é, uma terapia que esconde uma profunda violência simbólica: um dispositivo de enquadramento normativo da conduta, impedindo todo e qualquer desvio das normas da instituição.
 
Apesar disso, o início do filme mostra a enfermeira-chefe devotada e determinada a ajudar seus pacientes. Tudo é muito limpo, branco, ascético e rotineiro – lembro que, apesar da brancura, Mildred aparece, assim como McMurphy, com roupas escuras, criando um contraste entre eles e os demais personagens. Tudo é medido e racionado; tudo é, principalmente, vigiado. Há um aparente clima de paz, e a musiquinha leve de fundo corrobora um cotidiano anestesiado, quase doméstico. Além do mais, a beleza de Mildred suaviza seu lado metálico, tornando improvável qualquer demonstração de tendências maquiavélicas. Aos poucos, com as provocações constantes de McMurphy, a legitimidade de sua autoridade praticamente desaparece, revelando sua verdadeira face despótica. Sua desmoralização transforma, gradativamente, uma profissional dedicada numa encarnação sádica do mal. É uma evolução progressiva que pode ser acompanhada pelas mudanças de seu olhar, culminando numa sequência de closes no seu rosto, que inunda a tela, quando seus olhos espelham uma fusão, quase transcendental, de frieza e repreensão.

Contudo, a passagem do bem para o mal, no filme, não é ambígua; na verdade, é praticamente linear. A profissional dedicada é apenas o subproduto ocasional de sua essência maquiavélica. Sua dedicação é apenas aparência, desvelada pela provocação de McMurphy e, portanto, revelada em toda sua nudez: a enfermeira-chefe é vetor de um sistema de dominação, a psiquiatria. Por isso, quero ainda insistir nessa ambiguidade estrutural da institucionalização psiquiátrica.

Tudo indica, repressão e terapia não combinam. Geralmente, nas discussões, ou se percebe a prática psiquiátrica como repressora ou, ao contrário, como terapêutica – não se critica a ambiguidade. Mas posso pensar, por exemplo, a conexão entre repressão e terapia como uma forma institucional de se tratar uma rejeição social, os loucos, considerada como uma patologia mental, passível de ser, portanto, apropriada pelo discurso psiquiátrico. Nesse sentido, rejeição social + doença mental = ambiguidade institucional. No asilo, repressão e terapia combinam-se sem contradições por meio de uma repressão terapêutica ou de uma terapia repressiva. São os dois lados da mesma moeda da instituição total psiquiátrica.

Mas, voltando ao filme, pergunto-me novamente por que a enfermeira-chefe é vista apenas pelo seu lado repressor. Como já disse acima, o filme é influenciado pela antipsiquiatria, que tem como núcleo duro a seguinte premissa: a instituição psiquiátrica é, por definição, uma instituição da violência. Não me refiro somente ao asilo, mas também a toda assistência psiquiátrica. Aqui, não há ambiguidade, pois a instituição psiquiátrica é vista sob um único aspecto: um aparelho de poder. A antipsiquiatria faz uma relação profunda entre poder, saber e instituição. Possui uma desconfiança vital com toda intervenção prática sobre o outro, vista como necessariamente uma relação de dominação. Nesse sentido, tem um viés anarquista, pois essa desconfiança é, na verdade, com toda e qualquer forma de poder.

Não discutirei por que isso acontece (Perrusi, 1995, 2007, 2010), e sim analisarei, rapidamente, as consequências de tais premissas. A antipsiquiatria coloca em suspeição toda forma de reabilitação social, moral ou física, que institui, por definição, uma relação de poder na qual o profissional impõe ao cliente uma condição de inferioridade. Toda intervenção prática sobre o outro implica um saber que possui uma relação necessária com o poder. Há um trio nefasto na psiquiatria: saber – (poder) – intervenção. Por isso, as críticas à psiquiatria e ao seu saber são críticas ao poder do psiquiatra. É também crítica institucional, pois a instituição possibilita e viabiliza a intervenção prática sobre o outro.

Assim, para exemplificar, as práticas de controle social (psiquiatria, assistência social, justiça, polícia, medicina, educação) serão sempre vistas como relações de dominação — o pulo conceitual é imediato: poder, logo, dominação. O controle social é necessariamente totalitário, não importando aqui sua inscrição num espaço público democrático, pois seu fundamento é a violência institucionalizada. A tutela seria o produto lógico dos processos de intervenção social. Sendo assim, não causa surpresa que haverá sempre a reprodução dessa eterna tipologia: paciente, delinquente e assistido, manifestada por vários modos: mandato social, relações de dominação, saber profissional.

A crítica à psiquiatria é total. Inclusive, a lógica de dominação é imanente a toda sua história. De Pinel ao Capes, tem-se uma sequencia coerente, regular e necessária de acontecimentos que se realiza por diversos modos: exclusão social do louco (Foucault, 1978; 1984; 1987), tutela do desviante (Castel, 1976; 1983), socialização do doente mental (Swain, 1994). Creio que, pensar assim, implica algumas posturas metodológicas. Examinando principalmente as análises inspiradas por Foucault, percebe-se que os estudos teimam em centrar seu foco nos discursos oficiais, vistos como de poder, envolvendo determinados agentes, sobretudo psiquiatras e legisladores. Concede-se um peso fenomenal aos discursos oficiais, produzindo uma causalidade quase direta entre os discursos e suas representações públicas e as atividades práticas que acontecem no cotidiano da psiquiatria. O discurso oficial torna-se a realidade. Procura-se por meio dos discursos uma função social realizada pela instituição. O mecanismo é conhecido e, independentemente das diferenças entre os autores, a procura é praticamente a mesma: busca-se o momento originário e fundador donde surgiu a função institucional e se demonstra que, mais do que uma função, emergiu uma lógica imanente ao processo de constituição da instituição. Tal lógica acompanha, feito um grude, toda a história institucional; assim, o processo é marcado pela lógica… para sempre. Portanto, se na origem da instituição a função primordial era a exclusão dos loucos ou a tutela do desviante ou o poder de um saber, a lógica revelada permanecerá determinando a função institucional ad infinitum e, quem sabe, ad nauseam.

Fico pensando se tal abordagem não escapa de uma ilusão retrospectiva ao dotar a psiquiatria de uma razão objetiva, cuja imanência sempre é a mesma (poder, poder, poder…), embora sua manifestação concreta mude no decorrer da história. Como disse um crítico ferrenho de algumas análises foucaultianas: 
“é suficiente que um grupo enuncie com estridência um determinado projeto de poder para que o poder se faça tão real a ponto de dispensar o pesquisador de qualquer posterior averiguação” (Coelho, 1999: 66).
Bem... er... sim, não, mas sim, mas não, nem isso. É importante analisar os diversos projetos de poder, inclusive os embutidos nos discursos oficiais. Na verdade, minha crítica não passa apenas pelo que disse até agora, mas também pela tese, implícita o tempo todo nessas análises, de que a gênese esgota o processo — a postulação de uma lógica ou de uma razão objetiva que permanece determinante até agora na história da psiquiatria. Existiria algo embutido no saber psiquiátrico que o faria, independentemente da situação histórica, uma estratégia de poder. Com isso, toda assistência psiquiátrica implica, necessariamente, relações de dominação. O saber psiquiátrico, como estratégia de poder, produziu o famigerado asilo, instituindo a lógica asilar, grude eterno da assistência psiquiátrica — mesmo a Reforma Psiquiátrica não a elimina; ao contrário, repropõe-na numa configuração diferente (a reforma de Pinel não foi assim?).

Creio que sejam tais premissas, discutidas acima, não tão explícitas assim no filme, que transformam a enfermeira-chefe numa personificação do sistema. Ela seria uma figura emblemática da tutela psiquiátrica, embora passe um tanto despercebido o fato de que vários pacientes estão de forma voluntária na instituição. Tal aspecto revela alguma autonomia por parte dos pacientes, o que relativiza a tutela, embora não a elimine. O próprio McMurphy, numa parte do filme, questiona-os sobre sua servidão voluntária. O silêncio cabisbaixo e envergonhado dos pacientes nivela sua suposta escolha a uma sujeição, não importando se a tutela é compulsória ou não.

De fato, McMurphy pode criticá-los, até porque não assume o papel social de doente mental, mesmo quando finge que é louco. Sua crítica, no entanto, é ambígua, pois não vem de um paciente que critica o sistema por meio de sua inadequação à instituição, e sim de uma pessoa que finge ser doente. Sendo já desviante, já que vem da prisão, assume uma representação inadequada do papel de doente. Talvez, essa situação não o torne um libertador, e sim um manipulador de outro naipe. Admitamos, ele não é o louco mítico que detona qualquer tipo de normatização. Além do mais, não sofre o duplo vínculo que enquadra todo paciente psiquiátrico: alienado pela doença; alienado pela instituição. Ao contrário, McMurphy pondera e defende a liberdade – mas isso, convenhamos, naquela situação, era o que realmente importava.

E seria justamente a defesa da liberdade o ponto alto do filme. Pergunto-me, ao me deter nessa questão, se a loucura pode ser o espaço da liberdade. Desconfio que não, pelo menos da civil, que alicerça a democracia. No fundo, não tem como, pois a loucura está aquém e além da liberdade. Talvez, a loucura, como impossibilidade de toda e qualquer normatização, seja a liberdade absoluta, aquela que prescinde até da razão. A democracia precisa, entretanto, de uma liberdade minimamente fundada na razão. E intuo que seria em relação a essa “fundação” racional que a loucura realizaria uma crítica libertária da liberdade – uma crítica que desconstrói a neutralidade da razão em relação ao poder. E creio que muito anarquismo nutriu-se dessa possibilidade. Não nego, como crítica, sua fecundidade.

E é a liberdade o valor que une, no filme, McMurphy e o “chefe” índio (Will Sampson), outro que finge estar louco. Mas será fingimento? O chefe parece capturado pelo sistema e, ao mesmo tempo, tomado por uma necessidade de estar dentro dele. Uma necessidade que não é incompatível com sua captura pela instituição psiquiátrica. Parece procurar alguma redenção nessa descida ao inferno – alguma prova de si mesmo. Ele é um índio, logo, de alguma maneira, um desviante. Parece acometido de uma desordem étnica, antes de uma psíquica. Seu mutismo é eloquente e, talvez, sintoma de uma conduta isolacionista que o separa do mundo. Sua desordem, talvez, possua traços culturais que estruturam uma sintomatologia (Devereux, 1970).

Por que resolve falar logo com McMurphy? É certo que McMurphy, desde o início, interpela-o de forma constante. Acredito que o chefe perceba algum valor na inadequação, na irreverência e na resistência de McMurphy às normas da instituição. Esse valor, provavelmente, é a liberdade. Ele não se sente livre; mas, principalmente, não se sente merecedor da liberdade – “não sou ainda grande” – diz, num momento do filme. O contato com McMurphy é o início de um aprendizado, a sinalização de uma libertação.

Paro aqui, novamente, e faço outra reflexão – quem é McMurphy, afinal? No filme, ele é o que é por causa da genialidade interpretativa de Jack Nicholson. Seu carisma é transmitido ao personagem. No livro, o personagem radicaliza e vai bem mais longe. A postura de McMurphy desmascara, principalmente, a hipocrisia reinante no hospital, a rotina alienante e a falsa democracia. A enfermeira-chefe é a “Chefona”, uma “capadora de colhões”,
“que tenta fazer com que você fique fraco para que possa obrigá-lo a entrar na linha, a seguir as regras deles, a viver como eles querem que você viva” (89).
Inclusive, há um diálogo, que não foi filmado, embora esteja no livro, no qual os pacientes discutem, com lucidez, sua condição no hospital, e Harding (William Redfield), um dos pacientes, vaticina:
“O ritual de nossa existência está baseado no fato de os fortes ficarem mais fortes por devorarem os mais fracos. (...) Os coelhos aceitam seu papel no ritual e reconhecem o lobo como o forte. Para se defender, o coelho torna-se esperto, assustado, arredio e cava buracos e se esconde quando o lobo está por perto. E ele resiste, vai continuando. Conhece seu lugar. É absolutamente certo que ele não irá desafiar o lobo para um combate” (94).

No filme, aceitando a metáfora de uma antipsiquiatria antropomórfica, McMurphy seria a raposa que tenta sublevar os coelhos, mas não consegue, pois a raposa é solitária e idiossincrática, em excesso, para enfrentar os lobos. A raposa quer reconhecimento, ser o centro das atenções; logo, não pode, de fato, ser libertária. No fundo, é única e egoísta demais; mas, apesar do seu individualismo e, ao mesmo tempo, por causa dele, traz dentro de si a liberdade. E é aqui, de fato, que o chefe percebe, nitidamente, qual é o problema: a liberdade para McMurphy é impossível, mas pode ser apreendida e assumida.

E chegamos, enfim, ao final do filme. Creio, sinceramente, que é um dos finais mais epopeicos do cinema. Mas a preparação desse final precisa de uma discussão. McMurphy decide fazer uma festa de despedida, antes de fugir do hospital. Paradoxalmente, é a sua perdição, pois cai, enfim, vítima do sistema. Na verdade, renuncia à fuga, apesar de estar consciente das consequências de seus atos. Ao invés de fugir, fica perdido nos seus pensamentos. É quase uma escolha, quase uma imolação. A cena é lenta e, depois, com o flagrante do final de festa, tudo se acelera e ocorre, finalmente, por compaixão e solidariedade com o jovem Billy (Brad Dourif), o confronto derradeiro com a enfermeira-chefe. A reação da instituição é implacável: lobotomia. Pode-se questionar até que ponto o dito tratamento, nesse nível, é verossímil. Afinal, os médicos já desconfiavam da pantomima de McMurphy. A lobotomia, aqui, não seria terapia e sim uma clara punição. A instituição, por exemplo, não decide pelo retorno de McMurphy à prisão, o que seria uma solução plausível e prosaica, até médica, por incrível que pareça -- pensando bem, todos os indícios mostravam que, definitivamente, McMurphy não era louco. Porém, não há essa alternativa. A Instituição precisava realizar-se na Punição – a epifania de uma lógica implacável que reclui, exclui e, quando necessário, elimina essa forma de inadequação social, a loucura.

Creio que a mensagem é clara: a violência institucionalizada venceu a resistência. O filme, logicamente, encaminhava-se nessa direção. A lobotomia é função da visão sobre a assistência psiquiátrica, vista como um aparelho de poder. Assim, não poderia existir, para o caso de McMurphy, uma terapia e sim uma punição, se possível definitiva. A lobotomia é funcional ao filme, pois oferece a condição necessária para o seu grande final. É, nesse momento, que o chefe compreende que precisa praticar a eutanásia em seu amigo, pois o prefere morto a vê-lo como uma mera sombra, vagando na instituição. Sim, a vida pode ser intolerável. Matá-lo é, na verdade, libertá-lo e, ao mesmo tempo, libertar a si mesmo. O chefe recupera a (sua) vontade -- um ato de vontade é um sonho que se realiza em plena luz do dia. Paradoxalmente, a natureza de sua ação é trágica, pois conecta liberdade e morte. No ato, o chefe parece absorver a substância vital de McMurphy, sua potência de revolta e de liberdade. É o bastante para realizar o gesto inacabado de seu amigo e, enfim, fugir do tormento. Aquele bebedouro pesadíssimo era a metáfora da captura psiquiátrica: “Deixai toda esperança, vós que entrais”. A proeza de levantá-lo, jogá-lo na janela e, com isso, escapar do hospital era o milímetro que separava o chefe de McMurphy – ali, naquela ínfima diferença, guardava-se um abismo: entre o céu e o inferno, para parodiar um livro famoso da contracultura (Huxley. 2002). Salvando-se, o chefe parece correr, na cena final, em direção às montanhas, ao encontro da Natureza e de suas origens.

O grito último de Taber (Christopher Lloyd), diante da fuga do chefe, é a saudação ruidosa da liberdade louca e absoluta -- o fulgor intenso, sempre renovado, de uma vitória impossível. 

Bibliografia
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PERRUSI, Artur. Savoir psychiatrique versus savoir commun : un dialogue impossible ?. Ethnographiques.org: Revue en ligne de sciences humaines et sociales, v. 14, p. http://www.ethn, 2007.
SWAIN, Gladis. Dialogue avec l'insensé: à la recherche d'une autre histoire de la folie. Paris: Gallimard, 1994



[1] O nome da versão original é “One Flew Over the Cuckoo's Nest”, isto é, “Voando sobre um ninho de Cucos”. Parece que cuco designa uma pessoa mentalmente perturbada. No livro, chefe Bromden, o pequeno, recita uma canção cujos últimos versos são "wire, briar, limber-lock / Three geese in a flock / One flew east, one flew west / And one flew over the cuckoo's nest”. De todo modo, o ninho de cucos pode ser entendido como uma metáfora do asilo psiquiátrico.
[3] Etiológico, porque a psiquiatria nunca teve um consenso a respeito das causas da doença mental; nosológico, porque nunca teve um consenso a respeito de quais doenças trata a psiquiatria.
[4] Foucault (1978, 1979, 1984), Castels (1976, 1981), Basaglia (1976), Berlinguer (1985), entre outros.

8 comentários:

Tâmara disse...

Artur,

Em primeiro lugar, um protesto: andei lhe pedindo socorro, porque Jonatas andou re-postando un texto onde afirma (aparentemente contra você) que a natureza é um talvez, e você, nada!

Mas seu texto remeteu-me a uma esto'ria de uma enfermeira psiquia'trica amiga minha, la' de Marselha. Ela é um genui'no membro da contracultura,logo, da antipsiquiatria, etc. Mas passou sua vida profissional tratando de doentes mentais, lidando cotidianamente com essa ambiguidade da psiquiatria de que você fala tão bem. Pois bem: no final dos anos 1990,apareceu no hospital um mu'sico, no quadro de uma poli'tica pu'blica para "limpar" a psiquiatria dessa imagem de instituição total. Nas duas primeiras semanas, o rapaz estava encantado com os pacientes, regorgitando discursos foucaultianos contra a psiquiatria. Mas ai', rapaz, uma paciente resolveu apaixonar-se por ele e não o deixava mais em paz. Desesperadamente, ele procurou minha amiga enfermeira, que disse: "Eu lhe avisei: doido, é doido!".

No mais, a essa altura do campeonato, seus companheiros do Cazzo ja' ocuparam completamente a Alemanha. Acho que você vai ter que assumir essa bodega sozinho! Abraço.

Artur disse...

Aaah, o pessoal está na Alemanha... Aposto que estão envolvidos na crise da Grécia. Não causa surpresa que Jonatas esteja lendo sobre tragédia.

Tomarei o poder! O Cazzo é meu!

Passei um tempo fora do ar -- a Ufpb é um tipo de fordismo. Jonatas disse que a realidade é um "talvez"? Arrotarei materialismo vulgar em represália!

Abração pra tu.

Le Cazzo disse...

Esse Jonatas só diz bobagem, na Bomba Grande ou em San Martin. Quanto ao teu texto, Arturo, fico feliz em ler algo seu novamente aqui no Cazzo. Sempre que sentia falta, ia ao Blog dos Perrusi - onde li recentemente com entusiasmo acerca das mais recentes e profundas tendências da sociologia anglo-saxã. Mas não é a mesma coisa.

Gostei do texto. E fiquei pensando algumas coisas. Primeiro: laranja mecânica, que trata de algo semelhante, é da mesma época (1971 se não me falha o google, quero dizer, a memória). Acho que há coisas ali que podem encorpar ainda mais o seu texto.

Depois juntei duas peças: Mesmo com as tentativas do DSM III e IV de unificar diagnósticos mediante a catalogação de um conjunto de sintômas, você está certo: nada que se compare ao diagnóstico de um tumor. E se o DSM tenta fechar a sangria contrampondo-lhe algo delimitado a partir de interesses inconfessos atuando nesta direção (indústria da saúde, indústria farmacêutica) etc., os problemas que você identifica ficam evidentes quando percebemos que a prescrição de psicofármacos já não estão sob a tutela exclusiva de psiquiatras.

Tinha mais a dizer, mas deu-me uma preguiça... Abraço, Jonatas

Cynthia disse...

Arture voltou!

Artur disse...

Oxe, Hamburgo tem internet?!

É cada uma...

Cynthia disse...

Tem mais ou menos. Onde estamos, mais para menos.

Tâmara disse...

Artur, rapaz...

Desde domingo ando matutando sobre um detalhe de sua resposta ao meu comenta'rio: o de que a UFPB é uma espécie de fordismo.
Acho que o jeito é confessar: ando na maior saudade do fordismo! E nem acredito que a UFPB ainda esteja sob a hegemonia desse modelo (fiz mestrado ai', ja' era uma universidade bem mais robusta do que a que trabalho hoje.) Acredito mais que vivemos sob uma combinação insta'vel e esquisofrência entre fordismo e o que Richard Sennet chama de Burocracia MP3 (a respeito da organização do trabalho no "novo capitalismo").
Você até me inspirou com essa esto'ria. Se eu tiver tempo escreverei um textinho para o Cazzo, onde apresentarei minhas reflexões a partir de um caso concreto: uma reunião departamental para decidir o que fazer com um projetão fechado MEC/CAPES para especialização a distância no ensino médio da sociologia. Experiência riqui'ssima dessa combinação esquisofrênica...
Abraço, Tâmara

Artur disse...

Disse fordismo, mas deveria aspear "fordismo". Só queria dizer que trabalho mais (sem contrapartida no salário e nas condições de trabalho, vale assinalar). Como se estivesse numa fábrica mais ou menos organizada, comandada pelos capatazes do Mec e da Capes.

Nos tempos modernos da Ufpb, tentei organizar a carga de trabalho e virei uma máquina razoavelmente eficaz. Fiquei mais organizado, embora nitidamente mais cansado. Na verdade, aumentou minha jornada de trabalho (levo trabalho pra casa e trabalho no final de semana) -- era melhor, assim, falar em "exploração" e "precarização".

Acho que essa situação não causa propriamente surtos psicóticos e sim um tipo novo de "neurose", a síndrome de Burnout (esgotamento profissional) -- depressão, cansaço, cansaço, irritabilidade...

Abri um consultório informal e trato os professores, cobrando uma quantia módica. Estou ganhando muita grana e, inclusive, muita distinção (convenhamos, qualquer tipo de capital vale a pena). Tô me locupletando, em suma. Pensei em viajar a Hamburgo, imitando um pessoal maneiro que conheço.